Criar é preservar!

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Animais silvestres legalizados garantem a continuidade das espécies

2013-04-27 12:10:57


Deivit Albuquerque

Xerimbabo - “coisa muito querida”

2013-04-23 00:32:02


Deivit Albuquerque

Por que ter um réptil como animal de estimação?

2013-04-22 17:35:29

 


Essa é uma das primeiras perguntas que as pessoas que nunca tiveram contato com esse tipo de animal fazem. Eles não possuem amor pelo dono, eles não fazem truques, não brincam, não se mexem tanto quanto outros animais. Afinal, por que então alguém criaria um réptil como pet? A resposta para essa pergunta pode ser muito simples ou extremamente complexa.

Primeiramente, acho que cabe uma breve análise do porquê de alguém ter algum animal de estimação. Desde muito cedo na sua história, o homem começou a domesticar os animais. Os cães para a caça ou para segurança, os cavalos para transporte, bovinos para alimento e tração, ovinos para a lã, gatos para manter o controle de pragas como os ratos, etc. Também era bastante comum que os animais fossem mantidos por razões místicas, como no antigo Egito, em que crocodilos eram criados e adorados por representarem o deus Sebek, ou os gatos, que eram considerados seres divinos. Esse tipo de exemplo pode ser encontrado nas mais diversas civilizações ao longo da história da humanidade e demonstram que os animais, de uma forma ou de outra, sempre exerceram fascínio e estiveram muito presentes entre as pessoas.

Com o avanço da tecnologia e da ciência, muitas das finalidades ou papeis atribuídos aos animais deixaram de ter sentido, entretanto, eles continuaram a viver entre nós. Atualmente, e especialmente no contexto urbano, os animais cresceram muito sua importância no papel de companheiros das pessoas, ou, em outras palavras, como animais de estimação. É claro que aquelas espécies domesticadas há mais tempo e em maior número acabaram ficando mais populares, mas isso não quer dizer que animais diferentes deles não possam ser criados pelas pessoas numa relação de dupla via: de um lado o animal se beneficia de um ambiente confortável e seguro, e de outro lado a pessoa se beneficia do contato com o animal.

Há quem diga que o hábito de criar animais diferentes, ou tidos como silvestres, é uma extravagância que foi trazida às Américas por burgueses europeus excêntricos, o que é uma grande mentira. Estudos mostram que mesmo os povos que viviam isolados nas Américas já tinham o hábito de criar animais selvagens dos mais diferentes tipos, apenas pelo prazer de conviver com eles. Um estudo realizado em 2002 pela Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Selvagens – RENCTAS demonstrou que no território onde hoje fica o Brasil, os índios tinham o hábito de criar aves, mamíferos e até mesmo répteis sem nenhuma razão específica a não ser a de amar estar entre esses animais. Os índios os chamavam de xerimbabo, que significa “coisa muito querida”. Isso demonstra que gostar de estar entre animais, qualquer que seja a espécie, é uma condição natural do ser humano, e não um desvio de comportamento. É um comportamento internalizado no nosso patrimônio genético e não está ligado a nenhuma cultura humana específica, mas é comum a todas elas.

Superado então o entendimento de que a criação de animais é algo inato ao ser humano, voltamos então à pergunta inicial: por que alguém criaria um réptil? Em poucas palavras: por gostar de répteis. Por mais que grande parte da população tenha esses animais como repugnantes, existe também uma parcela bastante considerável de pessoas – parcela esta que só cresce – que os acha extremamente

atraentes. No mundo atualmente são descritas aproximadamente 8.000 espécies de répteis. Eles são extremamente variados quanto ao tamanho, comportamento, coloração e forma. Para muitos, não existe nada mais lindo do que um filhote de cachorro ou de gato. Para outros, um papagaio com suas cores exuberantes é a perfeição da natureza. E para outros tantos, o animal que exerce mais fascínio pode ser um réptil como uma serpente ou um camaleão. A beleza é subjetiva, ou, como diz o ditado popular: está nos olhos de quem a vê. Quem somos nós para julgar se um gato é mais bonito do que um periquito? O que importa é o gosto pessoal de cada um.

Quem é que se arriscaria a dizer qual desses animais é o mais belo?

Acima: Furcifer pardalis – Camaleão pantera.

Abaixo: Trichoglossus haematodus – Loris arco íris de peito vermelho.

Nos exemplos mostrados acima, é certo que cada pessoa pode ter sua preferência. Mas como julgar que a escolha por um deles é a correta e a escolha por outro é errada, antiética? Ora, não existe certo e errado quanto às nossas convicções e preferências particulares.

Um réptil sem dúvida não retribui o carinho que um cão retribui a seu dono. Mas será que a relação de reciprocidade afetiva é o essencial quando se busca um animal de estimação? A realidade mostra que não. Os peixes ornamentais são criados há séculos e não demonstram qualquer afeto. No entanto, há pessoas que dedicam sua vida a eles. Nesse sentido, o que importa é a sensação de contentamento que a pessoa tem por criar seu pet, seja ele a espécie animal que for. Então, se tudo depende do gosto de cada um, podemos ter qualquer animal como pet, só porque gostamos? Não. Há um limite, e o mais correto é que esse limite recaia justamente sobre interesses do animal. Se de um lado nos sentimos atraídos por um tipo de animal, por outro lado, por implicações éticas, é necessário que o limite seja o bem estar do animal. Isso significa que o animal deve encontrar em cativeiro condições de viver uma vida confortável e saudável.

Até mesmo Peter Singer, grande teórico da ética utilitarista e o grande defensor da bandeira da libertação animal, em seus textos conclui que o princípio norteador em relação aos animais é a igual consideração de interesses, ou seja, o interesse de alguém em ter um animal está em confronto com o interesse do animal de ter uma vida saudável (fisiológica e psiquicamente falando)? Mais especificamente ele se refere à ausência de dor e de sofrimento, defendendo que o cativeiro, por si só, não poderia ser considerado ético por causar sofrimento aos animais. Nesse ponto eu discordo veementemente de Singer, pois é possível, sim, haver uma convergência de interesses entre homem e animal à medida em que seja possível propiciar condições em cativeiro para que o animal tenha uma vida plena e sem qualquer sofrimento. De um lado o homem se beneficia da presença do animal, e de outro o animal se beneficia de uma vida confortável, saudável e longa (aliás, não faltam estudos mostrando que os animais em cativeiro vivem muito mais do que seus pares na natureza). É claro que o fato de viver mais tempo, não necessariamente significa viver com qualidade. Por isso, é imprescindível que o animal encontre em cativeiro todos os elementos essenciais para que atinja a plenitude de seu desenvolvimento. Dieta, assistência à saúde, quantidade e qualidade de espaço são alguns dos elementos chave na promoção do bem estar animal.

Assim, uma vez satisfeitas as necessidades mínimas quanto a esses e outros elementos promotores de bem estar, o animal pode, SIM, se desenvolver com plenitude em cativeiro. Em suma, o animal deve encontrar em cativeiro tudo o que precisa para que não sofra.

Esse é o critério mais justo e equânime para se estabelecer qual é o animal que pode ou não pode ser mantido como pet. O centro da questão recai, então, na preferência pessoal do dono, levando em conta sua capacidade de prover o que o animal precisa, e, por outro lado, no próprio animal e sua adaptabilidade à vida em cativeiro.

Acima: Terrários de Morelia viridis – Píton verde. Quem quer ter um animal,
deve poder arcar com seus custos e prover um ambiente saudável.

Tendo isso em mente, nas grandes cidades a rotina das pessoas vem se tornando cada vez mais atribulada e o tempo livre é cada vez mais curto. Os cães, gatos e outros animais com maior complexidade de comportamento social, justamente por se afeiçoarem ao dono, sofrem sozinhos a maior parte do tempo. Quem mora em uma grande cidade e não conhece um exemplo de alguém que sai todos os dias de manhã cedo e volta tarde da noite, deixando seu animal sozinho? Prova disso é que estão se multiplicando serviços como dog walkers, hotéis para cães e gatos e até mesmo creches para pets (chamados Day care). Isso reflete a falta de tempo que as pessoas têm para cuidar de seus animais. A despeito disso, o número de pets só vem aumentando e as pessoas mais e mais querem ter animais, estando dispostas a gastar boa parte de sua renda com eles. O mercado pet vem rendendo somas vultuosas (movimenta mais do que a linha branca, por exemplo), mas isso é assunto para outro artigo.

Nesse ambiente onde o tempo está a prêmio, ganham espaço novos tipos de animais, como é o caso dos répteis. Por não criarem esse laço afetivo com seus donos, eles são bem mais independentes e não sofrem com a falta do contato humano. Além do mais, por serem animais ectotérmicos (de sangue frio), seu metabolismo é muito mais lento do que o dos pets “tradicionais”, razão pela qual são bem menos ativos. Disso resultam duas características muito importantes: eles requerem muito menos espaço para viver com conforto (pois NATURALMENTE se locomovem pouco), e muito menos cuidados com limpeza e alimentação. Por exemplo: a maior parte das serpentes se alimenta em intervalos entre 7 a 30 dias, defecando também com esses intervalos. Ou seja, manter uma serpente dá muito pouco trabalho e poucos gastos, além de possibilitar que o dono viaje num feriado com a absoluta certeza de que seu animal estará em casa confortável. Já no caso dos lagartos, muitos se alimentam com frequência diária, mas alguns poucos minutos de cuidados pela manhã e o animal estará bem durante o dia inteiro. A verdade é que a maioria dos répteis, quando alojado num recinto adequado, pode levar uma vida plena e saudável com menos de 15 minutos de cuidados diários.

Outra coisa que se diz é que a manutenção de répteis em cativeiro é difícil por demandar muito conhecimento. Não passa de uma inverdade. É claro que o proprietário deve saber o que o animal precisa, mas a verdade é que o cuidado com os répteis é, para grande parte das espécies, muito simples, pois tudo o que eles precisam é fácil de prover, porque já existe no mercado uma gama de produtos especializados para seus cuidados: rações especiais, terrários pré-fabricados, lâmpadas que substituem o sol, aquecedores de ambiente, pedras aquecidas, tocas aquecidas, troncos e cipós artificiais, etc. Há ainda uma infinidade de livros escritos em linguagem muito simples e acessível (em inglês, é verdade, já que o IBAMA vem impondo muitas barreiras a esses animais e o mercado legal tem dificuldade em se desenvolver) para ensinar aos principiantes como cuidar de seus animais. As clínicas veterinárias especializadas também só aumentam. Portanto, não é verdade a suposição de que esses animais, se mantidos como pets, vão sofrer com maus tratos.

Bem, e se o argumento das pessoas que são contra a manutenção desse tipo de animal é que eles não são animais para se ter em casa, me parece que os cães e gatos jamais poderiam ser considerados bons animais de estimação para grande parte das pessoas (atualmente, cerca de 85% dos brasileiros vivem em cidades, com a maior concentração nos grandes centros). Por esse ponto de vista, os répteis não são apenas bons animais de estimação, eles são os melhores animais de estimação. Eles não precisam passear, não precisam de cuidados contínuos, não precisam de tanto espaço quanto um cão, não soltam pelos, não fazem sujeira e não vão sofrer quando seu dono passar o dia inteiro fora de casa. E tudo que vale para os répteis pode ser aplicado aos anfíbios e artrópodes.

E as doenças? Esses animais compartilham doenças com as pessoas? Claro que sim. Praticamente todo e qualquer animal pode compartilhar doenças com o ser humano, mas os répteis estão entre os animais mais seguros em termos de zoonoses (doenças que podem ser transmitidas ao Homem). A mais comumente associada a eles é a salmonelose, um doença causada por bactérias do gênero Salmonella e que causam um quadro de diarreia e desidratação. Porém, é uma bactéria extremamente comum no ambiente doméstico, existindo até mesmo na geladeira da casa de todos nós, principalmente na casca de ovos de galinha, mas passível de contaminação em qualquer tipo de alimento. Por isso, salmonella é uma das principais causadoras de intoxicação alimentar, quando não se faz uso de boas práticas de higiene ao manipular e preparar alimentos. A Salmonella pode estar presente até mesmo na água. Sendo o animal nascido em cativeiro e mantido em um ambiente limpo e alimentado com alimentos lavados ou manipulados de maneira higiênica, não há razões para ter medo.
ou ?

Você tem medo de ficar doente pelo contato com os répteis? Então melhor pensar muito bem a próxima vez que for comer aquele cachorro quente esperto, aquela saladinha saudável ou aquele delicioso ovo mexido. A verdade é que quanto menos aparentados conosco na escala evolutiva, menor é o número de doenças que os animais podem compartilhar conosco. Se fizermos essa comparação com animais bem mais comuns o número dessas doenças é assombroso. Eis a citação de algumas doenças (muitas delas bem mais perigosas do que a Salmonella) encontradas em animais que consideramos comuns: cão (raiva, leishmaniose, gonorréia, toxocaríase), gato (toxoplasmose, raiva, esporotricose) e bovino (brucelose, tuberculose). Basta pesquisar na internet e constatar que o número de doenças é enorme, mas nem por isso deixamos de ter contato com esses animais.

Creio que com os argumentos expostos ao longo desse texto fica bastante claro que os répteis podem ser animais de estimação formidáveis, vivendo uma vida longa e plena em cativeiro, sem sofrimento e sem risco para seus donos. Eles não só podem ser criados, como vieram para ficar, legalizados ou não. Estão conquistando cada vez mais espaço no gosto das pessoas.

Então, por que ainda não está regulamentado no Brasil? Eu também não sei... Responda você...

Bruno Ville – Advogado, Médico Veterinário.

 


Deivit Albuquerque

Lista Pet, combate ao tráfico e criação de animais: silvestre não é pet?

2013-04-16 13:55:36

O uso da fauna silvestre é um tema que vem gerando muita polêmica, dividindo grupos que se dizem protetores de direitos dos animais e grupos de criadores e simpatizantes. Um dos grandes problemas é a quantidade de desinformação que vem sendo propagada aos quatro ventos. Alguns fatos devem ser esclarecidos desde logo: por exemplo, defende-se que a Lista Pet do IBAMA representa um retrocesso e afrouxamento da legislação ambiental na medida em que vai permitir a criação e o comércio de espécies silvestres. Grande besteira. A Lista Pet é na verdade um endurecimento da legislação atual, que já permite a criação e comércio de animais sem nenhum limite no que diz respeito a quais espécies podem ser criadas.
A segunda grande besteira que vem se propagando é que os animais silvestres são retirados da natureza, onde são livres, para serem trancafiados e comercializados como objetos de decoração de pessoas que não se importam com a preservação da fauna. Nada mais falso. Para ser bem exato, no Brasil é proibido, e considerado crime, a captura e venda de animais silvestres desde o dia 6 de janeiro de 1967, que é a data da entrada em vigor da Lei de Proteção à Fauna (5.197/67). Desde esse dia, todo e qualquer animal silvestre que vá ser comercializado deve ser nascido em cativeiro num criadouro comercial devidamente autorizado pelo órgão competente. Exceção feita à pesca, em que se permite a coleta da natureza para comércio direto. Portanto, há mais de 45 anos é proibido retirar animais da natureza para vendê-los, e não é a Lista Pet ou nenhuma outra regra do IBAMA que vai mudar a situação. Nem mesmo a classe dos criadores comerciais defende que isso algum dia seja feito. Todo animal vendido legalmente no Brasil é nascido em cativeiro.
A terceira inverdade que vem sendo propagada é que “Silvestre não é pet”, infelizmente até com o apoio institucional do IBAMA. Pet é o animal criado em ambiente doméstico sem nenhum fim que não seja o de dar a ele todos os cuidados de que precisa, pelo tão só fato de que quem o tem, o faz de maneira desinteressada e simplesmente porque ama. Antes mesmo da chegada dos portugueses ao Brasil a fauna silvestre era criada assim pelos indígenas (tal qual acontece em todas as culturas): jiboias, araras, papagaios e macacos eram tidos pelas pessoas como membros da família. Isso não mudou até hoje, pois ainda continua sendo comum ter pássaros, papagaios, jabutis e até mesmo serpentes. Quase todo mundo conhece algum membro da família ou amigo que tem animais que não sejam cães ou gatos. De acordo com a Associação Brasileira de Criadores de Animais Silvestres e Exóticos – ABRASE (dados de 2012), são mais de 22 milhões de animais silvestres sendo criados como pets no Brasil (dados do IBOPE de 2005 apontaram para um número ainda maior: 60 milhões). O número de cães pet, para se ter ideia, é da ordem 30 milhões, o que demonstra que ter animais silvestres não é um hábito nem um pouco incomum.
Isso significa que os criadores defendem que qualquer animal deve ser vendido no mercado pet? Por óbvio que não. Qual seria então um critério razoável para separarmos o que pode ser pet e o que não pode ser pet? Sem dúvida os rótulos “doméstico” e “silvestre” não compõem um critério razoável, tanto é que milhões de brasileiros têm animais silvestres e os consideram pets. Portanto, a baliza mais proporcional e razoável que podemos utilizar para dividir o pet do não pet deve levar em conta a possibilidade do animal viver em condições de bem estar, considerado o ambiente residencial comum (uma casa ou apartamento de tamanho mediano) e também os riscos que esse animal pode representar para o dono e para a comunidade. Assim, uma onça pintada com certeza não pode ser pet, em primeiro lugar porque necessita de condições de espaço e tratamento que não poderão ser supridas num ambiente domiciliar comum e em segundo porque representa um risco real à vida do dono e também de toda a comunidade próxima, razão pela qual esse tipo de animal só pode ser mantido por zoológicos, criadouros ou mantenedores (pois estes passam por um processo de licenciamento ambiental para garantir que possuem toda estrutura e assessoramento necessários para cada espécie com a qual pretendem trabalhar). Já um papagaio ou uma jiboia, embora sejam considerados silvestres, podem viver num ambiente residencial com condições de conforto e bem estar, e não representam nenhum perigo substancial ao dono ou à vizinhança (óbvio que novamente aqui é usado o bom senso, pois um papagaio pode bicar, uma jiboia pode morder, um cão pode morder, e nada disso representa um perigo tal que justifique a proibição, já que é um risco pequeno e que um cidadão maior e capaz pode assumir).
Se considerarmos que o brasileiro contemporâneo vive principalmente em áreas urbanas, tem poucos filhos e passa muito tempo fora trabalhando, veremos que muitos animais silvestres são na verdade pets melhores do que os “tradicionais” cães e gatos. Isso porque vários deles não requerem cuidados constantes, não sujam a casa e não sofrem com a ausência do dono ao longo do dia. Não há qualquer dúvida de que um cachorro sente a falta do seu dono quando ele sai para trabalhar de manhã e retorna de noite, e isso é fonte de sofrimento (perda de bem estar, valor supremo quando se fala em animais em cativeiro). Por outro lado, uma jiboia, um iguana ou um curió não sofrem com isso. Um cachorro precisa ser levado para passear, precisa tomar banho, precisa de atenção constante. Uma serpente não precisa. Ela não precisa sequer (e nem pode) ser alimentada todos os dias, e fica muito bem se deixada sozinha por um final de semana ou feriado inteiros.
O perfil da sociedade brasileira mudou muito nos últimos 60 anos e o amor pelas mais diversas espécies de animais continua sendo o mesmo. A tendência é que cada vez mais as pessoas procurem animais diferentes, já que a dinâmica cotidiana é diferente, o espaço e tempo disponíveis são diferentes, e os animais que se adaptam melhor a isso sem prejuízo da qualidade de vida é diferente. Insistir que animais silvestres sempre são inadequados como pets é pura desinformação.
Portanto, meus amigos, essa história de “silvestre não é pet” é uma grande besteira que estão querendo colocar na sua cabeça. Não é pet aquele animal que não vive bem nas condições que você pode dar, pois afinal, o que importa é que seu bichinho esteja bem e feliz ao seu lado, independente dele ser peludo, escamoso, grande ou pequeno. Aliás, você sabe qual a diferença entre doméstico e silvestre, por lei? Nenhuma. Atualmente quem define isso é a Portaria 93/98 do IBAMA, que, sabe-se lá sob qual critério, arrola algumas espécies e coloca nelas o rótulo de “domésticas”. Eu aposto que você não sabia que o pavão, cisne negro e o ganso do Nilo são considerados domésticos. Qual a diferença deles para um papagaio? A meu ver é só uma: o papagaio exige licença do IBAMA enquanto os outros não.
Mas e o tráfico de animais? E a preservação da fauna? O comércio não vai piorar tudo isso? Não! E é fácil perceber as razões. A Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Selvagens - RENCTAS calcula que atualmente são retirados ilegalmente cerca de 38 milhões de animais da natureza pelo tráfico, e que 90% deles morrem antes de chegar ao destino final. Isso significa que o mercado consome cerca de 3,8 milhões de animais silvestres nativos do Brasil anualmente. Se o licenciamento de criadouros comerciais fosse facilitado pelos órgãos ambientais (como já manda a lei 5.197 desde 1967 e que nunca foi cumprida pelo governo brasileiro), esse número de animais poderia ser produzido em cativeiro sem dificuldade. Alguns dizem que muitos dos criadores na verdade se associam a traficantes e vendem animais capturados na natureza como sendo nascidos em cativeiro. “Esquentam” animais, na gíria popular. Em todas as áreas existem pessoas desonestas sim e que devem ser rigorosamente punidas, e o meio da criação de animais não é exceção. Ocorre que esses criminosos constituem uma ínfima minoria, tanto é verdade que diariamente no Brasil os os criadouros são fiscalizados e geralmente não são encontradas quaisquer irregularidades (salvo pequenos erros burocráticos de procedimentos legais, já que ninguém consegue entender a infinidade de normas confusas do IBAMA, nem mesmo seus servidores quando perguntados por telefone nas linhas das superintendências regionais).
A legislação atual exige detalhados relatórios semestrais ao IBAMA e aplica sanções bastante rigorosas, como o fechamento do criadouro e confisco de todo o plantel se um único animal ilegal for encontrado. A multa, que pode chegar a R$ 10.000,00 por animal (art. 24, § 1º, do decreto 6.514/08), é aplicada sobre o número total de animais do criadouro no caso de um único animal ilegal ser encontrado. E há vários meios para se detectar um animal capturado em meio aos nascidos em cativeiro, pois os capturados em geral são mais debilitados e podem apresentar sinais de captura como ferimentos e cicatrizes, que são raros em animais nascidos em cativeiro. Para algumas espécies também existe exame de DNA para checagem de paternidade, e o custo é baixo.
Logo, um criadouro que tem no seu plantel 100 animais está colocando muito a perder se resolver se arriscar na atividade criminosa, pois poderá ser multado em R$ 1.000.000,00, perder todos os animais, perder a licença de criadouro e responder a processos criminais e administrativos. O risco ainda vai muito além disso, pois a reprodução de animais silvestres no geral é muito técnica e depende de um manejo bastante meticuloso e de um plantel totalmente livre de doenças. Qualquer animal que chegue de fora e seja introduzido no plantel representa um risco grande de colocar todo o trabalho a perder, pois algumas doenças inclusive são de difícil detecção, incuráveis e demandam a eutanásia do animal portador. Por vezes, leva anos até que um criadouro estabilize um plantel e comece a produzir com alguma regularidade.
Nesse sentido, ainda que se considerasse que diante de todos esses riscos haveria pessoas dispostas a se associar a atividades criminosas, com certeza elas comporiam uma diminuta minoria e que poderia ser combatida. Façamos uma matemática bem simples e considerando o pior dos cenários: o tráfico atualmente vitima 38 milhões de animais, mas o mercado consome apenas 3,8 milhões. Considerando que os criadouros produzissem esses 3,8 milhões de animais, e admitindo, apenas por hipótese, que 10% dos criadouros (que é uma proporção altíssima e absolutamente irreal) comercializassem exclusivamente animais capturados do tráfico, estaríamos falando numa redução automática da ordem de 90% no tráfico de animais (o tráfico passaria de 38 para 3,8 milhões, que é o que esses 10% de criadouros consumiriam, já que eles venderiam 380 mil animais, o que demandaria a coleta de 3,8 milhões). Volto a dizer, estamos analisando por hipótese um cenário de altíssima criminalidade. Toda essa redução ocorreria apenas estimulando a atividade legalizada. Na linguagem popular, apenas numa “canetada”. E ainda haveria um bônus, pois agora seria possível ter todos os dados de quem comercializa animais, o que facilitaria o controle e a fiscalização, coisa que não acontece atualmente com o atual traficante de animais, que é anônimo, não tem endereço e nem CPF. Não existe, e nem existirá, nenhuma outra medida com potencial de apresentar tamanha eficiência no combate ao tráfico.
Outra tese de quem defende a proibição se ancora no fato de que o Estado não tem estrutura para fiscalizar todos os criadouros no caso de uma liberação ampla do comércio. Isso não é justificável. Em primeiro lugar porque o Estado não pode alegar sua própria ineficiência para impedir uma atividade lícita do particular (Sim! Atividade lícita! Lembra-se da lei 5.917/67?). Em segundo lugar porque a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (6.938/81) prevê um tributo chamado Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA, que serve EXCLUSIVAMENTE para custear a fiscalização pelo IBAMA (aliás a TCFA acabou de ser objeto de nova regulamentação pela IN 06/13 do IBAMA, o que demonstra que eles estão bem empenhados em cobrá-la). Logo, a falta de verba não é uma desculpa minimamente razoável, pois a fiscalização é custeada pelo próprio fiscalizado. Em terceiro lugar, é possível fiscalizar à distância, já que existe um sistema informatizado, o SISFAUNA, que permite obter dados de todos os criadouros ao redor do Brasil, e que unido aos relatórios semestrais que são entregues pelos criadouros, permitem ao agente fiscalizador uma boa ideia do que está acontecendo em cada criadouro. A partir desses dados é possível orientar as fiscalizações, pois quem está envolvido com tráfico costuma ter um perfil diferente dos demais, com menos morte de animais e um número maior de nascimentos, demonstrando, assim, uma eficiência incomum e suspeita nas atividades desenvolvidas (essa constatação já foi feita por fiscais do próprio IBAMA de Nova Friburgo - RJ). Basta agir com inteligência e direcionar as visitas de fiscalização para que o joio seja separado do trigo.
Eu quase havia me esquecido de mencionar outro fator. Quando se cria animais, existe sempre a procura por características específicas dentro de uma espécie: animais bonitos, mais dóceis, mais coloridos, ou que cantam melhor (no caso de passeriformes). Para dar um exemplo conhecido, nós partimos do lobo para chegar a todas as raças domésticas de cães que temos hoje. Com os animais silvestres é a mesmíssima coisa, pois há sempre uma busca por obter exemplares com características desejáveis. Quem cria um curió geralmente quer ouvi-lo cantar, tanto que existem torneios de canto de pássaros por todo o Brasil, que são muito difundidos e apreciados por quem gosta de pássaros. Os criadores, sabendo disso, cruzam as aves que cantam melhor e vão fazendo uma seleção dos descendentes, de forma que dentro de poucas gerações, os animais produzidos cantam muito melhor do que aqueles que existem na natureza. Dessa forma, a reprodução seletiva gera uma diferenciação substancial entre os animais criados em cativeiro e os animais da natureza. O tráfico de animais não consegue competir com isso, porque é uma atividade predatória, e todos os animais que consegue fornecer não têm a mesma qualidade dos nascidos em cativeiro. Outro exemplo que podemos destacar é o dos répteis, cuja reprodução seletiva gera animais com padronagens de cor absolutamente diferente dos animais selvagens originais. O tráfico não tem como competir com isso, simplesmente porque essas linhagens domesticadas não existem na natureza para serem capturadas. E o mercado percebe a diferença de beleza dos animais, deixando de comprar animais comuns (disponíveis no tráfico) cuja qualidade é absolutamente inferior. Se você não acredita no que digo, então faça uma pesquisa digitando o nome de 2 espécies: Boa constrictor (é a jiboia) e Pantherophis guttata (cobra do milho americana). Procure fotografias dessas espécies e verá que há uma gama tão extensa de linhagens domésticas (por domésticas quero dizer produzidas em cativeiro por várias gerações) que fica até difícil saber qual daqueles animais é o padrão selvagem original. Isso é tudo obra da reprodução em cativeiro. E volto a dizer: não existem na natureza e por isso não é possível adquiri-los do tráfico. A tendência é ao longo do tempo isso vá ocorrendo com todas as espécies criadas legalmente. E à medida que vai acontecendo, o mercado deixa de demandar os padrões selvagens e o tráfico deixa de ser compensador. Quanto aos criadouros: ou passam a reproduzir esses novos padrões ou fecham as portas porque o mercado demanda qualidade. Por isso a tendência do tráfico, independentemente de fiscalização, é acabar a partir do momento em que a criação legalizada é estimulada.
É por causa dessas coisas que o IBAMA e grupos protetores de animais devem perceber que lutar por uma Lista Pet pequena é lutar contra a preservação da fauna e a favor do tráfico de animais. O que os traficantes querem é justamente isso: que a atividade deles continue sendo lucrativa e procurada pelo mercado. Qualquer pessoa que seja contra a criação de animais silvestres por achar que isso vai causar captura de animais e ameaçar a fauna deve repensar suas ideias.
Muita gente está indo na onda do “Silvestre não é pet!” e da “Lista Zero”, mas lá no fundo não sabe do que se trata a situação. Divulgam-se campanhas sensacionalistas com fotografias de animais mortos, maltratados e entulhados em caixas de traficantes como se isso fosse a realidade do comércio legalizado. Absurdo! É contra isso que o comércio legalizado luta! O IBAMA divulga uma campanha contra o tráfico com essas fotografias e a frase de efeito “Isso acontece porque você compra”, mas na verdade é uma grande inverdade. Isso acontece porque o IBAMA não cumpre a lei e não estimula a atividade legal e sustentável.
A própria ideia da Lista Pet é errada e ilegal. Assim como a lei de proteção à fauna, podemos citar outras normas como a Política Nacional da Biodiversidade, a Convenção de Biodiversidade, a Convenção Internacional para o Comércio de Espécies de Plantas e Animais Ameaçados de Extinção, todas essas no sentido de que a atividade legal e sustentável deve ser estimulada pelo Poder Público. O item 12.3.10, da Política Nacional da Biodiversidade, por exemplo, dispõe: “Apoiar, de forma integrada, a domesticação e a utilização sustentável de espécies nativas da flora, da fauna e dos microrganismos com potencial econômico”, e o que está sendo feito é justamente o contrário. O que é a “domesticação”? É justamente a seleção de animais diferenciados com os quais o tráfico não pode competir!
A ideia de Lista Pet vai contra o uso sustentável, contra a preservação, e a favor do tráfico de animais. Todos os países civilizados adotam uma estratégia muito mais razoável e eficiente: a de elaborar listas de animais proibidos, justamente aqueles mencionados no começo do texto como não sendo pets. Tudo o que pode ser criado como pet deve ser permitido e deve ser estimulado pelo Poder Público, ou o tráfico vai continuar a assumir esse mercado, mas sem ética e sem regras.
Achar que ter animal silvestre é escravizar um animal, enquanto ter um animal doméstico é dar um lar a um animalzinho que não sobreviveria sem o Homem é uma grande besteira. É contribuir com o tráfico, é incentivar pessoas que não deveriam ter cães e gatos a tê-los (por não terem condições de tempo e espaço, quando poderiam ter um animal diferente em perfeitas condições).

Por: Bruno M. G. Ville, Advogado e Médico Veterinário.


Deivit Albuquerque

Lista “PET” – O Ato Final

2013-04-16 09:51:17

Encerando o debate sobre a publicação, por parte do IBAMA, da relação contendo as espécies silvestres que poderão ser criadas e comercializadas no país como animais de companhia, a famosa “Lista PET”, gostaria de tecer alguns comentários finais.

Inicialmente, quero agradecer a todas as pessoas que enviaram suas opiniões, contra ou a favor, da Lista PET. O exercício da democracia se faz através da participação cidadã. Esse espaço público acatou todas as opiniões e as publicou sem nenhum tipo de restrição. A proposta desse debate se mostrou extremamente frutífera. Foram milhares de compartilhamentos e visualizações, além de uma expressiva participação por meio da disseminação dos artigos nas mídias sociais e dos inúmeros comentários recebidos.

Hoje tive a oportunidade de me reunir com o presidente do IBAMA, Volney Zanardi Júnior, e também com alguns técnicos da instituição. Aproveitei a oportunidade para entregar ao mesmo todos os artigos e comentários aqui postados. Como podem conferir no link abaixo:

DGCA IBAMA

Tenho convicção de que todos os comentários representam uma manifestação da sociedade e, como tal, merecem chegar às mãos daqueles que tem a responsabilidade de tomar as decisões finais. Nesse sentido, acredito que o blog cumpriu uma missão muito importante: atuou como um espaço democrático para o debate e encaminhou todas as opiniões a quem, de fato, cabe a responsabilidade de decidir.

Concluo, reafirmando a minha posição de jornalista militante na área ambiental, de ser favorável a publicação e ampliação da Lista PET. Ressalto ainda que, ao contrário do que muitas pessoas imaginam, essa “lista” não vai autorizar a criação ou a comercialização da fauna silvestre. Isso, a criação e a comercialização, já é fato no Brasil e está respaldado por Leis Federais e Convenções Internacionais do qual o nosso país é signatário. Os que defendem a “Lista Zero” estão completamente equivocados em sua essência. A luta dos “zeristas” deveria ser focada na mudança da Lei, que já autoriza essa prática no país. Somente uma Lei tem o poder de revogar outra Lei. Se não querem a criação de animais silvestres para fins comerciais, que dirijam seu pleito ao Congresso Nacional. Ao IBAMA não cabe analisar ou opinar sobre a Lei. A esse órgão cabe apenas o dever de cumpri-la, sobre a luz do Artigo 37 da Constituição Federal, que é bem claro quando afirma:

“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”

E é na esperança de que o IBAMA aja com base na impessoalidade, que ficaremos no aguardo da publicação da “Lista PET”.

Por fim, gostaria de fazer um mea culpa. No meu artigo anterior afirmei, equivocadamente, que os que são contra a tal “Lista PET” são “adoradores de duendes” ou “histéricos”. Isso não é uma verdade. Pessoalmente conheço inúmeras pessoas que são contra a Lista e que são estudiosos no assunto e possuem bagagem técnica para embasar suas opiniões. Eu quis me referir a um pequeno grupo de pessoas que não admitem o contraditório e que agem baseados apenas na emissão de opiniões vazias. E muitos desses se manifestaram aqui. Aos que se sentiram ofendidos com as minhas críticas, peço minha humilde desculpa pelo erro da generalização. Isso não voltará a ocorrer.

 

http://blogs.estadao.com.br/dener-giovanini/lista-pet-o-ato-final-3/



http://blogs.estadao.com.br/dener-giovanini/files/2013/04/DGCA-IBAMA1.pdf


Deivit Albuquerque

FAUNA BRASILEIRA NA LISTA “PET”: PROIBIR, REDUZIR OU AMPLIAR? EIS A QUESTÃO

2013-04-11 18:12:36

Fomentando o debate sobre a Política Nacional de Fauna Silvestre e sobre a “lista PET”, o Blog publica agora, também com exclusividade, uma oportuna e fundamentada reflexão da Médica Veterinária Dora Palha, professora da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) e Conselheira Técnica da Organização Não Governamental RENCTAS (Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres). Dora Palha também coordena o PROJETO BIO-FAUNA, de cunho interdisciplinar e interinstitucional, que busca abordagens sistêmicas voltadas a uma ecologia social amazônica. O Bio-Fauna abrange pesquisa, ensino e prestação de serviços universitários sobre aspectos biológicos gerais e reprodutivos de vertebrados, conservação in-situ e ex-situ, etnozoologia e socioeconomia dos recursos faunísticos da Amazônia, além de educação ambiental. Todos os comentários são bem vindos. Boa leitura! Dener Giovanini!

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Como tema faunístico do momento, importante, palpitante, complexo e delicado, a lista “PET” estabelece uma importante dialética. Nesse debate, avolumam-se opiniões palpitantes apresentando-se e defendendo-se variados pontos de vista. O processo é salutar e deve ser incentivado nas diversas circunstâncias, tanto por meio de fóruns legalmente constituídos como em redes de discussão informais.

Neste artigo de opinião, ofereço algumas reflexões como contribuição ao tema. Sem dúvida, é interessante e enriquecedor conhecer os inúmeros pontos de vista apresentados, pois há opiniões de pessoas de distintas formações, ideologias e práticas, entre outras características. A meu ver, há que se considerar que as políticas necessitam ser estabelecidas por instituições fortes e por processos participativos e éticos. O problema, embora não sendo recente, permanece demandando reflexão e debate, a partir de fundamentação técnico-científica que considere conceitos, fatos e cenários, contemple a participação de especialistas e membros dos segmentos implicados/interessados nas políticas para a gestão da fauna. Por isso, não vejo como me ater a meramente expressar uma opinião sobre a concordância ou discordância acerca da produção em escala de espécimes da fauna como estimação (pet), pelos motivos a seguir:

1º) Por entender que há circunstâncias interferentes que necessitam análise, a partir de subsídios técnicos a serem melhor  conhecidos e discutidos, além do  que permanece a ser observado;

2º) O delineamento de políticas dessa natureza (e seus marcos regulatórios) para um país continental e assimétrico, como o Brasil, deve ser pautado em “projetos pilotos” (que considerem concomitantemente variáveis geográficas, biológicas, econômicas, etc), conduzidos por instituições sérias e isentas, sob a chancela da gestão pública, como balizadores dos sistemas e processos e, posteriormente, adaptados e ampliados em termos de amplitude geográfica e escala de plantéis/produção. O país ainda carece de ambos, pilotos representativos e instituições públicas fortalecidas e confiáveis;

3º) Pelos exemplos reais que vivenciei e vivencio, há duas décadas, seja diretamente, em criadouros de animais em escala comercial (domésticos ou não), seja indiretamente,  pela participação em inúmeros fóruns de discussão que envolvem proteção e bem-estar animal, o Brasil ainda contabiliza problemas gravíssimos. Indiscutivelmente, eles serão ampliados com a inserção de novas espécies (não-domésticas para fins de uso afetivo,  no caso em tela). Portanto, há ainda muito que debater em termos dos limites éticos na relação homem-animal, em especial os propósitos, espécies e os respectivos sistemas de produção, sob os princípios do bem-estar animal (BEA), da conservação da biodiversidade, do ambiente e sua ecologia e da relação custo-benefício desses sistemas. Quem realmente é ou será beneficiado? O produtor e/ou os demais integrantes do sistema de produção? A população, especialmente a local? Assistiremos ao modelo globalizado à custa de pesados ônus locais? Em paralelo, há que se avaliar a competência institucional para minimamente assegurar que não haja o agravamento das atuais mazelas. Este aspecto institucional é fruto de item posterior deste documento, para contribuir à reflexão sobre o porquê de termos chegado a esse status quo, com chances de agravamento futuro;

4º) O debate mundial sobre as relações humanos-animais é crescente, por suas implicações éticas e práticas para o ambiente e sua sustentabilidade, para a saúde e os sistemas de produção e de uso da terra. Nesses últimos, a produção animal em escala, relacionada às espécies domésticas (ou de laboratório) para uso eminentemente comercial, tem sido um dos principais alvos, pela gênese de graves “problemas-filhos”: ambientais (inclusive, sanitários), para o BEA e, enfim, para a qualidade de vida, em geral. Isso está implicando na crescente busca de alternativas aos sistemas de produção animal. Nesse sentido, um dos principais desafios é a inversão na lógica de produção do conhecimento e geração de tecnologias. Ao invés da lógica CAPITALISTA E GLOBALIZANTE de querer a qualquer custo ADAPTAR O AMBIENTE ÀS CULTURAS, adotar uma lógica COLETIVA E DE BASE LOCAL de se ADAPTAR AS CULTURAS AO AMBIENTE. Portanto, nesse contexto o aproveitamento da diversidade local é importante e necessário, desde que sejam considerados os limites da sustentabilidade dos sistemas e não o ilimitado, resultante da lógica de mercado do LUCRO pelo LUCRO. Nessa busca, há condicionantes que necessitam muita atenção e é fato que O BRASIL NÃO ESTÁ FAZENDO SEU DEVER DE CASA;

5º) Os sistemas de produção não estão estabelecidos, nem validados, com raríssimas exceções. Ressaltando-se que a validação deve considerar não somente os métodos/técnicas/tecnologias da produção em escala, mas cada ambiente/território e suas circunstâncias. Os vetores para a produção de animais como “pet” ou outros fins comerciais podem estar na contramão dos vetores conservacionistas. Estes necessitam de uma análise ecossistêmica, mais que a embasada em qualquer fator de mercado. Quem deve responder a esses desafios? Obviamente muito se espera das competências acadêmico-científicas nacionais, em especial, as Universidades e Institutos de Pesquisa, entre outros. Nesse âmbito, verifica-se que as indispensáveis contribuições da pós-graduação e da pesquisa científica geradas no país, particularmente pelas instituições públicas, tornam-se cada vez mais restritas. O sistema de avaliação atualmente vigente, que condiciona programas, áreas de concentração e linhas de pesquisas, premia as pesquisas “úteis”, rápidas e fáceis, ao invés das que podem efetivamente fundamentar políticas e programas que o país e a população demandam, bem mais lentas, porém mais transformadoras para que se assegure um ambiente mais saudável e uma melhor qualidade de vida;

6º) Mais importante que o resultado, é a confiança no processo. Podemos assegurar que um debate sério, participativo e transparente, pautado no rigor técnico e em conformidade aos preceitos éticos do BEA, da proteção do ambiente e de sua diversidade, dos interesses públicos e da soberania nacional?  No atual cenário brasileiro, em geral, as instituições públicas estão cada vez mais frágeis, porque os grupos ou partidos se sobrepõem aos da missão institucional e da coletividade em geral. Há, portanto, uma crise na gestão pública, refletindo numa credibilidade decrescente. Portanto, do que tem sido proposto e operacionalizado, em termos de política & gestão na temática da fauna silvestre ou mesmo ambiental, entre outras, pouco pode ser corroborado como o mais acertado, seja por fragilidades nas bases técnicas e científicas, seja por fragilidades dos processos decisórios e gerenciais.

Lidando com o dilema quanto a proibir, reduzir ou ampliar o uso de animais silvestres como estimação, penso que questões ainda ecoarão por muito tempo: Quantas e quais espécies? Em qual escala, ambiente(s), território(s)? Sob qual sistema? A que preço? Para quem? Há limites? São Éticos? Consideram-se princípios de BEA? Como aferir o BEA?

Enfim, à luz do que expus, mantenho-me cada vez mais cautelosa na emissão de qualquer opinião favorável à “flexibilização”, pelo governo brasileiro, da legislação atualmente em vigor, quanto aos aspectos restritivos às questões ambientais em geral e, particularmente, ao que tange espécies da fauna nativa, quanto à produção comercial, independente dos fins.

Maria das Dores Correia Palha, Médica Veterinária pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (1982), Mestre em Ciências Veterinárias (Clínica da Reprodução) pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (1992) e Doutora em Ciências Biológicas (Fisiologia e Farmacologia), pela Universidade Federal de Pernambuco (1999). Professora Adjunta da Universidade Federal Rural da Amazônia – UFRA, em Belém/Pará e Conselheira Técnica da RENCTAS.

 


Deivit Albuquerque

COMÉRCIO DA VIDA SILVESTRE: O ÉTICO E O ILEGAL

2013-04-11 13:54:47

Comércio da vida silvestre: o ético e o ilegal


A Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas) completa, em 2009, 10 anos de atuação no combate a essa atividade criminosa que tantos danos causa a nossa biodiversidade. Nesse período acumulamos experiência e adotamos várias estratégias no sentido de obtermos êxito em nossos objetivos.


As vitórias foram maiores que as derrotas. Conseguimos lançar luz sobre um tema até então pouco falado e conhecido no Brasil. Mobilizamos a opinião pública com o apoio da imprensa e obtivemos grande sucesso diante da necessidade de construirmos uma política pública eficaz para enfrentar esse problema. Foram quase 4 mil agentes públicos treinados em 17 workshops realizados no país, diversas publicações sobre o assunto e incontáveis ações destinadas a contribuir com a formação de uma nova consciência ambiental.


Hoje, percebemos que estamos diante da necessidade de uma nova forma de atuação. Não adianta mais nos repetirmos. O que precisava ser feito, o foi, com ousadia, determinação e seriedade. Hoje o Brasil sabe que o tráfico de animais existe e que o mesmo não é apenas uma maneira alternativa e inocente de um cidadão ganhar um dinheirinho extra. As CPIs das quais tivemos oportunidade de participar e contribuir constataram a abrangência dessa atividade ilícita e, principalmente, o nível altamente profissional das quadrilhas que atuam nesse ramo, muitas vezes associadas ao tráfico de armas e de drogas.


A necessidade de uma nova postura e atuação frente a esse crime ambiental origina-se, principalmente, no fato de precisarmos buscar uma alternativa eficiente que impacte diretamente na diminuição da demanda por parte da sociedade. A legislação ambiental precisa ser aprimorada e a repressão mais aparelhada, mas em essência, só isso não basta. A diminuição da demanda passa necessariamente por duas discussões fundamentais: uma forte iniciativa educativa, no sentido de desestimular a compra, pela sociedade, de animais oriundos do comércio ilegal e, a mais polêmica: definir claramente o papel da criação comercial no combate ao tráfico de animais silvestres.


Parte do movimento ambientalista não admite sequer debater a segunda alternativa. Alegam que o comércio legal é antiético por comercializar a vida, que gera lucros exorbitantes para os criadores e que os preços praticados no mercado legal – altíssimos – não afastam o consumidor do mercado ilegal.

Esses argumentos merecem respeito e, principalmente, reflexão. Porém, é necessária uma visão anticartesiana. Uma reflexão com base em fatos e não apenas em paixões. A começar devemos – sempre importante – lembrar que vivemos numa democracia, onde existem leis que nos garantem o respeito às diferenças. E a lei, nesse caso, garante ao cidadão o direito de possuir um animal silvestre de forma legal, oriundo de um criadouro devidamente credenciado pelo Ibama.

Os tais lucros exorbitantes dos criadouros, que agem dentro da lei, não parecem corresponder à realidade, uma vez que o investimento numa criação comercial é uma atividade bastante onerosa, o que explica, em parte, o alto preço de venda desses animais. E o mercado consumidor, apesar de ser imenso, na prática ainda é tímido. A burocracia brasileira ainda emperra o crescimento do setor.

Quanto ao "comércio de vidas" é um argumento baseado em convicções pessoais, para o qual não existe a possibilidade de debate. E em conflitos que envolvem moral e ética invoca-se o respeito à diferença, ou seja, a aplicação da lei. Se a lei existe, certa ou errada, deve ser cumprida e, neste caso especifico, a nossa legislação, como já dito, permite o comércio da fauna silvestre. Assim como permite o comércio de outros tipos de vida, como a madeira, o frango, o boi e o escargot. Cabe a cada um apenas aplicar a sua consciência pessoal no momento de optar pela aquisição ou não de um animal silvestre oriundo de criadouro. Aos que discordam, cabe apelar ao parlamento para que a lei seja mudada.

O Brasil não irá avançar no combate ao tráfico de animais silvestres – e num plano geral, na conservação da biodiversidade – enquanto não adotar uma posição clara e objetiva sobre a criação comercial. É necessário que se tenha coragem política para assumir uma postura definitiva, mesmo que seja uma decisão que desagrade os gregos ou os troianos. A falta de transparência só favorece àqueles que se alimentam da obscuridade.

A Renctas está disposta ao debate público. Mas que seja um debate que se concentre em soluções democráticas para o país, e não apenas em interesses setoriais de ambientalistas ou de criadores. Não se trata de discutir se permite-se ou não a criação comercial – isso a lei já definiu – mas é necessário que o governo estabeleça quais serão as regras a serem seguidas e quais os seus planos para uma fiscalização eficiente do setor, que expurgue desse meio aqueles que só querem uma fachada legal para enriquecer às custas da ilicitude. Hoje, quem se dedica a criação de fauna silvestre no Brasil com o objetivo de realizar um trabalho honesto, correto e dentro da lei, sejam criadouros comerciais, conservacionistas ou científicos, serão os primeiros aliados do governo na implementação de uma ação mais rígida na fiscalização.

E, se de fato, o governo federal quer alçar a criação comercial da fauna silvestre numa alternativa ao comércio ilegal, deverá obrigatoriamente implementar, através do BNDES, uma linha de crédito para financiar o setor e criar as condições necessárias para que os preços praticados no mercado sejam mais acessíveis ao consumidor.

Esse é o desafio para os próximos 10 anos da Renctas: ajudar a construir um país de verdade, onde o faz-de-conta perca espaço para ações corajosas e inovadoras na busca de soluções que a mantenham sempre no caminho da sua missão contribuir para a conservação da nossa rica biodiversidade.

Dener Giovanini é fundador e atual Coordenador Geral da Renctas.
www.renctas.org.br


http://www.renctas.org.br/pt/informese/artigos.asp?id=15

Deivit Albuquerque

Lista PET, uma interminável e questionável discussão!

2013-04-09 17:18:17

Dando prosseguimento ao debate sobre a Política Nacional de Fauna Silvestre e sobre a “Lista PET”, o Blog publica, com exclusividade, uma excelente reflexão do ex-superintendente do IBAMA/GO (2004 a 2011), Ary Soares. Além de ser um profundo conhecedor do tema, Ary Soares, durante o período em que ocupou a Chefia do órgão em Goiás, implementou diversas e importantes iniciativas para a conservação da fauna silvestre no estado. Aproveito a oportunidade para agradecer publicamente a todos que enviaram suas opiniões sobre a publicação anterior, contra ou a favor. Informo ainda que todos os comentários precisam ser necessáriamente moderados e aprovados por mim e, democraticamente, li e aprovei todos, integralmente. Boa leitura!  Dener Giovanini

PET é a especificação de animais silvestres criados ou com potencial de serem criados como bichos de estimação pelo ser humano. Lista PET é a titulação de um debate que tem colocado de lados opostos criadores comerciais desses animais, o Governo, por meio do IBAMA (que ainda coordena o debate) e aqueles que são contra a criação das espécies silvestres com fins comerciais, bem como sua posse por humanos.

Não vou aqui entrar nas minúcias do embate entre favoráveis e contrários à criação com fins comerciais, tal embate, dentre tantas outras analises, é tratado com maestria por Dener Giovanini no artigo: O tráfico de animais silvestres e os criadouros da fauna brasileira. Faço aqui, um convite para que adentremos os aspectos legais que sustentam ou deveriam sustentar a definição da esperada Lista PET.

O convite é para uma analise para a qual eu já tenho opinião formada e que estou disposto a reformulá-la, se alguém, com contra argumentação com base nos aspectos legais, convencer a mim de outra interpretação. Aos fatos:

Em novembro de 2007, o Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA, por meio da Resolução 394, com o objetivo de disciplinar a criação comercial de animais silvestres, determinou que o IBAMA procedesse em um período de seis meses, a lista das espécies silvestres que poderiam ser criadas e comercializadas. O prazo caducou, portanto há mais de cinco anos! Neste intervalo de tempo caducou também a legalidade do ato em si.

Por razões que desconheço o debate ainda prospera com a interveniência do órgão federal mesmo após a edição da Lei Complementar Federal 140/2011. Esta LC 140/2011 teve o mérito de encerrar indefinições e sobreposições de atuação dos órgãos ambientais em seus diferentes níveis federativos, ela é resultado de um longo debate sobre competências dos órgãos ambientais municipais, estaduais, do Distrito Federal e da União, órgãos que compõem o Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA. Foi a solução negociada no parlamento para por fim aos conflitos que tiveram origem na Constituição Federal de 1988.

Antes da promulgação da LC 140/2011, a responsabilidade pela ação ambiental (comando e controle) era comum entre os componentes do SISNAMA sendo a gestão do recurso natural fauna competência do órgão federal (IBAMA). Após a LC 140/2011, o comando e controle, ou seja, autorização para acesso aos recursos naturais e a fiscalização sobre tal acesso, deixou de ser comum e passou a ser objetiva, isto é, de competência especifica de determinado componente do SISNAMA, com níveis de ação claramente definidos nesta Lei. Salvo alguns aspectos ainda a ser regulamentado no âmbito dos conselhos Estaduais de Meio Ambiente e das Comissões Tripartites, como por exemplo: tipologias de licenciamentos que são de competência dos municípios.

O comando ou autorização para uso (licenciamento) relativo à fauna encontra-se claramente amparado na LC 140/2011, e nele, em meu entendimento, não cabe mais a interveniência do CONAMA e do IBAMA. A elaboração de uma lista PET desde então, é de competência dos Estados! Ao IBAMA cabe elaborar a lista das espécies ameaçadas de extinção. A titulo de facilitar a presente argumentação compilo o que expressa a LC 140:

Art. 8º –  São ações administrativas dos Estados:

XVIII – controlar a apanha de espécimes da fauna silvestre, ovos e larvas destinadas à implantação de criadouros (grifo nosso) e à pesquisa científica, ressalvado o disposto no inciso XX do art. 7o;”. Claro está, que a questão de fauna relativo a criadouros e que leva a uma eventual “lista PET” é atualmente competência dos Estados!

Ao IBAMA cabe o cumprimento de outros aspectos da Lei, nesta temática, no que tange às espécies ameaçadas de extinção, à introdução de exóticas e a exportação “de componentes da biodiversidade”:

Art. 7º São ações administrativas da União:

XVI – elaborar a relação de espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção e de espécies sobre-explotadas no território nacional, mediante laudos e estudos técnico-científicos, fomentando as atividades que conservem essas espécies in situ;

XVII – controlar a introdução no País de espécies exóticas potencialmente invasoras que possam ameaçar os ecossistemas, habitats e espécies nativas;

XIX – controlar a exportação de componentes da biodiversidade brasileira na forma de espécimes silvestres da flora, micro-organismos e da fauna, partes ou produtos deles derivados;

A competência da União ficou estabelecida para listar espécies ameaçadas e ainda, fomentar “as atividades que conservem essas espécies in situ.”, nesta tarefa, fomentar a conservação “in situ”, uma parceria com criadouros comercial e ou conservacionista pode ser estratégica, ajudando a diminuir tempo e reduzindo custos na criação e reintrodução na natureza de espécies ameaçadas de extinção, um exemplo: o pássaro canoro bicudo (Sporophila maximiliani.), altamente ameaçado na natureza e que procria com facilidade nos criadouros comerciais.

Não cabe, esta bem claro, à União (IBAMA), listar as espécies com interesse comercial, esta competência esta bem definida como sendo dos Estados. Mesmo quando a LC 140/2011 ainda mantém uma ressalva que possa incitar dúvidas (inciso XX do Art. 7º. – controlar a apanha de espécimes da fauna silvestre, ovos e larvas), leva a entender que se trata de atender as demandas de fomento e não deve ou não deveria servir de empecilho para o estabelecimento de criadouros comerciais.

Antes que os contrários ao entendimento aqui exposto tentem se ancorar em aparentes dubiedades do texto legal, quando a Lei diz em “controlar a exportação”, ela se refere especialmente às espécies nativas que não tem origem em espécimes oriundos de manejo. Ressalto para exemplificar, que o IBAMA não autoriza corte de madeira (salvo em áreas por ele licenciada, como hidrelétricas na Amazônia Legal, por exemplo), entretanto o órgão tem a missão, juntamente com os Estados, de também combater os produtos de origem ilegal e para isso baixa normas para a exportação de madeiras nativas.

O combate à ilegalidade é, aliás, uma defesa firme e irretratável de toda a sociedade, em especial daqueles, como a maioria dos criadores comerciais, que se submetem às mais complexas e onerosas exigências para manter seus negócios em funcionamento. Infelizmente, ainda temos uma cultura nos órgãos de fiscalização de atuar com mais competência e agilidade sobre os empreendimentos que ao menos em algum momento se submeteram ao crivo do órgão fiscalizador. A fiscalização firme e constante dos criadouros de fauna comprova tal afirmativa. Afinal, o traficante somente passa a ter endereço e CPF quando é flagrado, bem diferente de quem opera na legalidade.

Sempre me posicionei por maior flexibilidade na elaboração da pretensa lista, posicionando incluso contra os argumentos de alguns colegas que alegavam ser preciso “um freio de arrumação”, com a defesa de uma lista mínima ou mesmo “lista zero”. Os defensores desse “freio de arrumação” ainda se baseiam em parte na incapacidade de efetiva fiscalização dos órgãos competentes. Sempre defendi que um ordenamento amplo e transparente, que favoreça a competência dos eventuais interessados, é a melhor forma de fiscalização, pois amplia a oferta de origem legal tanto para o mercado local como para exportação, diminuindo automaticamente a pressão sobre o estoque silvestre (o caso dos jacarés-do-pantanal relatado por Dener exemplifica bem isso).

Portanto, reafirmo que a tal Lista PET, discussão que interagi oficialmente enquanto superintendente do IBAMA, tornou-se quanto ao órgão normatizador, inapropriada e sujeita a questionamentos por parte do publico interessado, seja este público contra ou a favor da lista ampla ou reduzida que esta por ser editada, pois salvo as espécies ameaçadas ou exóticas, a competência de normatização cabe aos Estados. Se os Estados estão aptos ou não a assumir tal responsabilidade é outra questão.

Ary Soares – Analista Ambiental do IBAMA/GO. Especialista em Gestão de Áreas Naturais Preservadas e em Avaliação de Impactos Ambientais e Mestre em Geografia (Apropriação do Espaço no Cerrado).

 

http://blogs.estadao.com.br/dener-giovanini/lista-pet-uma-interminavel-e-questionavel-discussao/

 


Deivit Albuquerque

O tráfico de animais silvestres e os criadouros da fauna brasileira

2013-04-05 19:38:58

Uma grande parte das organizações ambientais aguarda, com certa expectativa, a nova relação de espécies silvestres que poderão ser criadas e comercializadas legalmente no Brasil. Conhecida como Lista PET, ela será publicada em breve pelo IBAMA. Esse documento já nascerá desagradando a gregos e troianos. Se for uma lista pequena ou restritiva, provocará a indignação dos atuais mantenedores de fauna no país. E se conter apenas uma única espécie já será o suficiente para revoltar os que defendem a proibição total, ou, “lista zero”.

Esse debate, coloca em lados opostos os que lutam bravamente pela conservação das espécies e os românticos adoradores de duendes, que satanizam aqueles que ousam a pensar diferente deles. Esse último grupo tem por hábito se apresentar através de manifestações pessoais carregadas de xiitíssimo fundamentalista e choramingos histéricos. Querem apenas fazer barulho e pouco ou nada tem a contribuir com um tema tão importante. Muito pelo contrário, seus argumentos são frágeis e não resistem a uma mínima avaliação séria.

Os que defendem uma “lista zero”, usam como principal argumento a associação entre os criadores comerciais de fauna e o tráfico de animais silvestres. Nada mais falso. O tráfico de animais silvestres existe desde o descobrimento do Brasil e nunca dependeu do comércio legal para existir, crescer e se manter. Ao contrário: a criação comercial legal oferece ao consumidor uma alternativa à ilegalidade. O fato de existir a possibilidade de um cidadão comprar um papagaio legalmente (o que é o desejo de muitos brasileiros) é uma grande oportunidade de se atingir os que vivem da ilegalidade. Também afirmam que o comércio legal estimula o tráfico por que existem criadores que se utilizam da fachada legal para praticar a ilicitude. De fato, existem criadores mal intencionados. Mas são poucos e precisam ser severamente combatidos. A grande maioria dos mantenedores de fauna silvestre no Brasil é formada por pessoas sérias e comprometidas com a preservação das espécies.

Os defensores da “lista zero” também argumentam que a criação comercial da fauna favorece a disseminação de zoonoses. É um argumento falacioso. A disseminação de zoonoses é resultado direto do comércio ilegal, uma vez que os animais são retirados diretamente da natureza e levados para as casas dos consumidores finais, sem passar por qualquer tipo de controle sanitário. Nos criadouros legalizados, as zoonoses praticamente não existem e os animais possuem severo controle sanitário, já que qualquer doença no plantel pode representar um enorme prejuízo financeiro e até mesmo o fechamento do criadouro em virtude da perda das suas matrizes. Também argumentam os “zeristas” que a criação comercial pode favorecer a introdução de “espécimes invasores” na natureza. Outra inverdade. A introdução de espécies exóticas na natureza ocorre e continua ocorrendo exatamente devido ao tráfico de animais silvestres. Todos os criadouros autorizados tem em seu plano de manejo um sistema de controle de fugas. Além disso, espécies criadas em cativeiro podem ser facilmente controladas com a utilização de sistemas de marcação (microchips) ou, ainda, através da comercialização de espécimes estéreis. E, ao contrário do tráfico de animais, onde as espécies são adquiridas por preços baixos, os animais adquiridos em criadouros representam um investimento por parte do comprador, que terá assim, um maior cuidado com o animal. Alegam ainda os defensores da “lista zero” que os animais mantidos em cativeiro “sofrem”. Mas se esquecem que os criadouros só comercializam espécies nascidas em seus recintos e, portanto, habituadas a essa condição. Sofrimento existe no comércio ilegal, devido aos meios cruéis utilizados na captura, transporte e venda. O sofrimento animal deve ser combatido sempre, porém deve se focar em quem o pratica, para que receba a devida punição.

Por fim, os zeristas afirmam que o comércio de animais silvestres deve ser proibido por que o IBAMA e os demais órgãos responsáveis pela fiscalização ambiental não são eficientes em seu trabalho. Aqui, se constata um enorme equívoco. A falta de estrutura de fiscalização não deve ser a razão para se proibir a criação comercial. Se assim for, deve-se proibir integralmente a pecuária no Brasil, uma vez que a criação clandestina de porcos, frangos e bois existe exatamente devido a fragilidade de fiscalização nesse setor. Se formos seguir esse raciocínio, vamos proibir todas as atividades das quais o governo tem dificuldade para fiscalizar. Ou seja, vamos fechar o país. E os defensores da “lista zero” vão além: afirmam que a criação comercial da fauna leva a uma redução ou a extinção drástica das espécies. Aqui, talvez influenciados pelos duendes que veneram, cometem um erro primaz e realmente digno de um zero. A “extinção ou redução drástica de espécies” se deve a diversos fatores, como o desmatamento ilegal, o tráfico de animais silvestres, a caça predatória, etc. A criação comercial, ao contrário, beneficia a conservação das espécies, uma vez que, além de diminuir a pressão sobre a fauna nativa, oferecendo ao consumidor animais nascidos em cativeiro, também contribui através da pesquisa (e consequentemente maior conhecimento sobre a nossa biodiversidade) e da disponibilização de espécimes para reintrodução e repovoamento em áreas já degradadas pelo ser humano.

Porém, pior do que argumentos frágeis e desprovidos de respaldo técnico e racional, é o fato de se acreditar que o debate sobre a lista de espécies autorizadas a serem comercializadas pelo IBAMA vá resolver os graves e verdadeiros problemas da nossa biodiversidade. Independente do tamanho que essa lista tiver, seja com nenhuma, poucas ou muitas espécies, nada irá mudar na postura equivocada com que o governo trata a nossa fauna silvestre. A começar pelo excesso de normas, decretos, Instruções Normativas e mais uma infindável coleção de letras mortas que só faz aumentar a burocracia e, consequentemente, facilitar a vida daqueles que, mediante extorsão, vivem de “dar um jeitinho” para o cidadão. A própria “Lista Pet” pode sofrer mudanças a qualquer momento, de acordo com uma Resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) e isso só aumenta a insegurança jurídica e a instabilidade em nossa política nacional de Meio Ambiente.

Aqueles que realmente se preocupam com a nossa biodiversidade, especialmente pela nossa fauna silvestre, deveriam apoiar as iniciativas que são desenvolvidas pelos criadouros comerciais, científicos e conservacionistas da fauna brasileira. São eles – em sua maioria formada por pessoas abnegadas, que investem seus próprios recursos, sem nenhum incentivo governamental – que dão a verdadeira contribuição para a conservação das nossas espécies nativas. Quem deve ser combatido é o meliante, aquele que vive de explorar ilegalmente os nossos recursos naturais. E bons exemplos para se apoiar a criação comercial não faltam.

No Pantanal brasileiro, até bem pouco tempo atrás, a caça predatória do jacaré (Caiman yacare) era a maior risco sobre esse animal. E foi graças à criação comercial dessa espécie, que essa ameaça se dissipou. Hoje, 51 fazendas pantaneiras criam e exportam a carne e o couro do jacaré criado em cativeiro.  Com isso, o nosso país se tornou o segundo maior exportador mundial, atrás apenas da Colômbia. O resultado: as populações de jacarés na natureza hoje estão livres da ameaça de extinção. E mais, em algumas regiões já está existindo até mesmo excesso de população crocodiliana. O antigo caçador hoje vive legalmente, empregos foram gerados e a economia pantaneira foi potencializada com essa atividade, resultando em conservação da espécie em vida livre. Deve-se lembrar também que só está sendo possível recuperar a população de micos-leões-dourados (Leontopithecus rosalia) graças à manutenção dos exemplares que estavam em cativeiro, mantidos por criadores conservacionistas e zoológicos. Se não fossem eles, essa espécie já estaria extinta na natureza, assim como ocorreu com a Ararinha azul (Cyanopsitta spixii). Muitos outros bons exemplos existem, como o caso do Pirarucu amazônico, uma espécie também ameaçada. Devido à implantação de projetos destinados a criação, manejo e uso sustentável do Pirarucu, muitas comunidades ribeirinhas tem conseguido aumentar a sua renda e diminuir a pressão sobre essa espécie. Fechar os olhos para essa realidade e desacreditar a criação de espécies silvestres é contribuir para a perpetuação da ilegalidade, da hipocrisia e do pensamento medieval da “intocabilidade ambiental”, que tantos prejuízos econômicos e sociais já provocam em nosso país.

A decisão de possuir ou se alimentar de um animal silvestre deve ser uma opção baseada em princípios pessoais e jamais deve embasar uma política de Estado, pois a realidade brasileira não é a realidade de São Paulo, do Rio de Janeiro ou de Brasília. O Brasil é diverso e essa diversidade precisa ser respeitada. Opiniões pessoais, ideologias e princípios religiosos merecem todo o respeito, porém, jamais devem ser argumentos para a construção de uma efetiva, concreta e eficaz politica nacional de conservação da biodiversidade.

Eu, por exemplo, não acredito em duendes, mas torço para que eles existam e possam ser vendidos legalmente, assim poderei ter a opção de comprar um, antes que eles entrem em extinção.


http://blogs.estadao.com.br/dener-giovanini/o-trafico-de-animais-silvestres-e-os-criadouros-da-fauna-brasileira/


Deivit Albuquerque

A opção pela criação legal de animais silvestres em ambiente doméstico Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/ece_incoming/a-opcao-pela-criacao-legal-de-animais-silvestres-em-ambiente-domestico-3976439#ixzz2PU8MGb5o © 1996 - 2013. Todos

2013-04-04 11:27:34

POR HUDSON PINTO SAMPAIO SANTOS

Publicado:19/03/08 - 0h00
Atualizado:19/03/08 - 0h00

Criar animais silvestres em ambiente doméstico não foi uma invenção de alguns "algozes da natureza" que a partir do ano 2000 montaram um complô para tornar um mundo um lugar inabitável. Criar animais em domesticidade na verdade faz parte da cultura milenar de todos os povos de todos os países do mundo. Desde os seus primórdios os homens e mulheres domesticaram animais, e foi isso que permitiu que alguns deles assumissem funções importantes em nossos dias, seja na composição de nossa alimentação, seja na função de companhia ou estimação.

Alguns argumentam que existem animais que não compõem a fauna silvestre e podem ser utilizados como "pets", deixando nossos exemplares em ambiente natural. A aceitação desta hipótese é tão descabida como querer que deixemos de falar nossa língua para falarmos o inglês, ou deixar de ouvir nossa música e ler nossa literatura porque já existem música e literatura de qualidade no exterior, ou ainda relegar nosso folclore porque existem outros à disposição. É a verdadeira negação da nossa cultura e raízes.

Por outro lado, todos sabemos que nos outros países, notadamente da Europa e América do Norte, a criação da nossa fauna é legal, o que gera a incongruência de sermos forçados a criar o Periquito Australiano, o Canário Belga e o Ferret deles, enquanto felizardos estrangeiros criam nossas Iguanas, Canários-da-Terra, Azulões etc.

Os incautos ainda dirão que não existe motivação plausível por parte dos criadores. Cheguei a ler a barbaridade de que somente se cria por caridade, vaidade ou lucro. Reduz-se a nossa cultura e paixão a tão baixo nível! Todos nós certamente conhecemos pessoas que se dedicam à criação de animais por puro altruísmo, embora esta não precise ser necessariamente sua única motivação. A felicidade de conviver com um animal estimado se compara, muitas vezes, à felicidade do convívio com um ente querido. Se está havendo exageros de vaidade ou de lucro, que se estudem mecanismos que coíbam estas práticas.

Outros ainda baseiam seus argumentos nas dificuldades de fiscalização, normalmente os responsáveis por esta. A estes eu proponho que parem de se comportar como organizações não-governamentais e tratem de cumprir com suas atribuições que certamente haverá tempo de sobra para tal mister.

Todos nós sabemos que os motivos da diminuição de nossa fauna assumem várias vertentes, inclusive algumas que, apesar não menos graves que o tráfico de animais, são mais significativas do ponto de vista destrutivo como, por exemplo, a destruição do habitat e da alimentação natural, a poluição e a corrupção. Todos nós sabemos também que tudo isso pode ser controlado, bastando haver mais trabalho e menos discurso e desídia por parte de nossas autoridades.

A falta de tato, o preconceito e o ranço dos que se revestem de "ongueiros" fajutos (que nada têm a ver com o trabalho sério desenvolvido por muitas ONGs), inclusive aqueles que deveriam se revestir do princípio administrativo constitucional da impessoalidade, não fazendo a defesa de opiniões pessoais, mas observando a questão de cima e de uma forma holística, certamente se dá ou pela desinformação e falta de formação ou mesmo pela desocupação. E há de se enfatizar que o preconceito com aqueles que criam e amam seus animais de estimação pode ser comparado a qualquer outro preconceito, dada a agressividade de seus arquitetos.

Aqueles que fazem a defesa cega da impossibilidade da criação doméstica, além de terem argumentos frágeis, estão desrespeitando os direitos individuais e coletivos de outras pessoas e em nada estão contribuindo para a preservação da natureza. Muito pelo contrário, estariam condenando para sempre à ilegalidade uma parcela muito significativa da população que certamente não deixará sua cultura e paixão de lado.

Hoje, pode-se dizer que ainda estamos engatinhando no sentido de se obter uma situação favorável no que tange ao quantitativo de animais em regime de domesticidade que atendem aos requisitos legais e aqueles que são retirados arbitrariamente da natureza, porém a negação dos avanços que se tem conseguido é um retrocesso e só contribui para que a ilegalidade prevaleça. Temos sim que educar nossa população a adquirir animais legalizados e estimular a reprodução destes.

Defender a simples proibição da criação de nossa fauna em domesticidade é tão insano quanto defender que ninguém mais se alimente de animais abatidos. Por mais que alguns se sintam afetados com esta condição, o respeito aos direitos de uma parcela muito mais significativa da população e à sua cultura milenar deveria fazer com que estas pessoas, com um mínimo de reflexão, submetessem seus caprichos à razão e procurassem alternativas de realmente se fazer um trabalho adequado de manejo de nossa fauna silvestre. Somente isso poderá salvá-la!Este texto foi escrito por um leitor do Globo Online. Quer participar também e enviar o seu?Clique aqui



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